quarta-feira, 29 de março de 2017

Análise às Obrigações de Serviço Público nas ligações aéreas entre os Açores e o Continente e os Açores e a Madeira em 2016


As ligações aéreas entre os Açores e o exterior podem ser divididas em dois casos, mais concretamente as rotas liberalizadas e as rotas sujeitas a Obrigações de Serviço Público (OSP), sendo que, desde o final de março de 2015, as OSP contemplam as seguintes rotas:
  • Funchal / Ponta Delgada / Funchal
  • Lisboa / Santa Maria / Lisboa
  • Lisboa / Horta / Lisboa
  • Lisboa / Pico / Lisboa
Atualmente, as rotas sujeitas a OSP são operadas pela Azores Airlines, a qual integra o Grupo SATA — a transportadora aérea açoriana cujo único acionista é o Governo dos Açores. Assim, não só a SATA é, de certo modo, propriedade de todos os açorianos, bem como algumas das suas atividades podem ser alvo de análise por parte da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA). Devido a esta última razão, e em resposta a um requerimento apresentado na ALRAA, a SATA disponibilizou várias estatísticas relacionadas com as rotas sujeitas a OSP, as quais são analisadas de seguida.

Em 2016, todas as quatro rotas sujeitas a OSP registaram mais voos e mais passageiros transportados do que em 2015, perfazendo um total de 1561 voos e 143.260 passageiros, os quais se distribuíram por rota como o gráfico seguinte mostra.


Como é possível observar, a rota Lisboa / Santa Maria / Lisboa foi a que registou menos passageiros transportados (11.897), enquanto a rota Lisboa / Horta / Lisboa foi onde ocorreu o maior movimento de passageiros aéreos (76.871). Por outro lado, e devido à utilização de diferentes tipos de aeronaves, mais voos não significou necessariamente mais passageiros transportados; a rota Funchal / Ponta Delgada / Funchal registou quase o dobro dos voos do que a rota Lisboa / Pico / Lisboa (470 vs. 252), mas esta última teve mais passageiros transportados do que a primeira (27.247 vs. 27.245).

Os dados estatísticos divulgados contemplam também o número de voos realizados, os divergidos e os cancelados. Deste modo, e para cada rota, é possível calcular qual a percentagem de voos que não chegaram ao seu destino (seja por cancelamento ou por divergência) em relação ao total de voos programados, percentagens estas que se encontram no gráfico que se apresenta de seguida.


A rota Funchal / Ponta Delgada / Funchal pode ser considerada como a mais fiável, pois foi aquela que atingiu o menor índice de não realização de viagens (0,8%), seguindo-se a rota Lisboa / Santa Maria / Lisboa (1,4%), depois a rota Lisboa / Pico / Lisboa (6,3%) e finalmente a rota Lisboa / Horta / Lisboa (9,7%). Estes dados estatísticos permitem tirar outra conclusão: como três destas rotas utilizam o aeroporto de Lisboa, e assumindo que a percentagem de cancelamentos ou divergências devidas a este aeroporto é constante para as três rotas, pode-se inferir que um voo para Santa Maria tem maiores probabilidades de não cancelar/divergir do que um voo para a ilha montanha, bem como um voo para o Pico tem maiores probabilidades de efetivamente se realizar do que um voo para ilha do Faial.

Em termos do negócio da aviação, a estatística mais importante será porventura a taxa de ocupação de ocupação, isto é, o número de passageiros transportados face aos lugares oferecidos. As estatísticas oficiais divulgadas permitem calcular esta importante métrica, sendo que se apresenta na tabela seguinte as taxas de ocupação para cada rota sujeita a OSP e para quatro situações diferentes: média anual de 2016, média do Verão IATA (de abril a outubro, onde foram transportados cerca de dois terços dos passageiros), média dos meses associados ao período do verão (de junho a setembro, onde foram transportados cerca de metade dos passageiros) e a média dos meses da época alta (julho e agosto, onde foram transportados cerca de um terço dos passageiros). Em todos os casos foi feita uma comparação com o ano de 2015 (a cor verde corresponde a um aumento da taxa de ocupação, enquanto a cor vermelha indica um decréscimo face a 2015).


A primeira conclusão a tirar é que, à exceção da rota Lisboa / Horta / Lisboa, todas as restantes aumentaram a taxa de ocupação em 2016 face a 2015. Procedendo agora a uma análise detalhada por rota, é possível concluir o seguinte:
  • Funchal / Ponta Delgada / Funchal — Esta rota apresentou uma taxa de ocupação média anual de 72%, a qual não varia muito ao longo do ano (na época alta atingiu os 75%), o que significa que a oferta ao longo do ano serviu sempre de forma igual a procura registada.
  • Lisboa / Santa Maria / Lisboa — Esta rota foi a que registou as mais baixas taxas de ocupação, sendo que estas foram inclusivamente inferiores a 50% no total anual e no período entre abril e outubro (o valor mais elevado da taxa de ocupação, 63%, foi atingido na época alta); contudo, ressalve-se que esta rota obteve um crescimento face a 2015 em todos os períodos analisados e ainda podem existir algumas situações de redução artificial, embora ligeira, da taxa de ocupação devido às escalas que alguns destes voos efetuam em Ponta Delgada (ver situação semelhante descrita para a rota Lisboa / Pico / Lisboa).
  • Lisboa / Horta / Lisboa — Considerando a média anual, esta rota foi a que registou a maior taxa de ocupação (75%), bem como registou taxas de ocupação superiores a 80% nos restantes períodos analisados; no entanto, e apesar destes valores, é de salientar que esta foi a única rota cujas taxas de ocupação diminuíram em 2016 quando se compara com o ano de 2015, o que significa que o aumento de voos não se traduziu na mesma proporção de passageiros transportados.
  • Lisboa / Pico / Lisboa — A análise à rota que liga a capital portuguesa à ilha montanha pode ser dividida em duas partes: quando existiram escalas na ilha Terceira ("voos redondos") e quando os voos foram diretos (em 2016, apenas foram diretos os voos no período entre maio a setembro). No caso dos "voos redondos", por vezes verificaram-se situações onde existiam lugares disponíveis mas que não podiam ser adquiridos pelos passageiros com destino ou origem no Pico [exemplo 1 | exemplo 2], o que reduziu artificialmente a taxa de ocupação, sobretudo no período da época baixa (em ambos os períodos analisados que incluem escalas na ilha Terceira, esta rota que serve o Pico registou taxas de ocupação entre 68% e 78%). Quando se analisa os períodos onde os voos foram sempre diretos entre Lisboa e a ilha montanha em ambos os sentidos, não só esta rota assume a liderança na taxa de ocupação de entre as rotas sujeitas a OSP (82% entre junho e setembro e 88% entre julho e agosto), bem como as estatísticas mostram que a melhor taxa de ocupação mensal obtida pela Azores Airlines numa rota sujeita a OSP foi de 92% no mês de agosto de 2016 (sendo inclusivamente a única ocorrência de todas as rotas que ultrapassou a barreira dos 90%). Recordando que o número de voos aumentou de 2015 para 2016, este resultados ainda se tornam mais surpreendentes, pois significam que o aumento de voos correspondeu a uma proporção ainda maior nos passageiros transportados!

Resumindo, os números não enganam: o Pico está na moda!

Haja saúde!

8 comentários:

  1. LOL sabem perfeitamente que a SATA ganhou mais ocupação para o Pico devido à insistência da mesma em aterrar no Pico em vez do Faial só porque sim, tem mais ocupação agora obviamente porque esquecem-se que quem desembarca no aeroporto do Pico a maioria dos passageiros apanham a lancha para vir para a Horta porque o objectivo inicial da viagem era Lisboa Horta e não Lisboa - Pico... Esquecem-se também que a SATA em 260 voos para a Horta divergiu/cancelou 60 e tal sem razões nem justificações aparentes. E ainda dizem que "o Pico está na moda"?! lool é de rir. Atenção que não quero rebaixar nada nem ninguém mas o que a SATA está a fazer não se vê em lado nenhum do mundo e pelo que se está a ver só não compreende quem não lhe dá jeito compreender. Para complementar o meu comentário e antes de me começarem a responder sem fundamento agradeço que vejam o seguinte vídeo e depois reflictam neste artigo/notícia aqui escrito.
    https://www.facebook.com/100011927289924/videos/vb.100011927289924/240741166333458
    Haja saúde!

    ResponderEliminar
  2. Caro Rúben,
    Obrigado pelo comentário. Respeitando os seus argumentos, gostaria de chamar a atenção que, para efeitos estatísticos da SATA, seja o voo realizado ou divergido para outra ilha, os passageiros contam sempre para o destino inicial previsto, logo parte da sua argumentação não é de todo válida, nomeadamente a relativa ao aumento das estatísticas do Pico à custa de divergências para esta ilha.
    Relativamente aos cancelamentos, a SATA cancelou/divergiu cerca de 60 voos na rota da Horta sim, mas em 701 programados (e não em 260 como referiu), daí a percentagem da não realização de voos de cerca de quase 10% para este aeroporto — não comento as razões para estes cancelamentos/divergências, pois não sou piloto nem tenho conhecimentos para opinar sobre o que é um "bom dia" para aterrar ou não; apenas analiso as estatísticas, fruto da experiência profissional que tenho nesse tipo de análise.
    Quanto a dizer que "a Pico está na moda", é a minha opinião baseada sobretudo no facto de esta rota ter crescido 11 pontos percentuais na taxa de ocupação face a 2015, mesmo tendo sido feitos mais voos! (Comparando com as restantes rotas, onde também houve mais voos em todas, a de Santa Maria e a do Funchal cresceram ambas 7 pontos percentuais, enquanto a da Horta decresceu 4 pontos percentuais) Por outras palavras, quando para uma determinada rota se aumenta o número de voos e a taxa de ocupação também sobe, é sinal de que a procura superou as expectativas (pois os passageiros podem aumentar e a taxa de ocupação se manter, o que significa igualar as expectativas, ou mesmo decrescer a taxa de ocupação apesar de se transportar mais pessoas, sendo isso sinal de que foi abaixo das expectativas).
    Haja saúde!

    ResponderEliminar
  3. Você não percebeu parte do que disse, fico com essa sensação. É verdade que quando os voos são divergidos os passageiros são encaminhados para o seu destino final pela própria companhia (não faz mais que a sua obrigação), mas e quando os voos passam a ser retirados duma ilha e a ser postos noutra os passageiros aí da primeira ilha (Faial) já terão que se dirigir à pretendida pelos seus meios e aí a ocupação já se conta é na segunda ilha (Pico) ou não?! E acho que aí os dados são errados e "viciados" em relação à taxa de ocupação forçadamente ou não concorda?? A SATA para fazer essas médias e mais não sei quê foi buscar só e unicamente os voos que lhe convinha e fez comparação... isto cabe na cabeça de alguém? Isto é de gente séria? não, não é!! Se a matemática foi feita aos totais de voos de cada ilha, que é como deve ser obviamente, o resultado aí inverte-se, mas essa situação como já não convém, ninguém (importante) fala nisto... explique-me lá porquê??
    Outra coisa que fala o vídeo que mostrei que nem sei se viu: um passageiro da Horta por exemplo, que quer ir a Lisboa, tem um voo directo a x preço, mas tem outro mais barato com escala em PDL, óbvio que opta pelo mais barato e aí é um truque da SATA para mostrar valores falsos na ocupação, é menos 1 passageiro HOR-LIS... explique-me lá estas situações que eu e o restante pessoal "ignorante" gostaria de saber :o

    ResponderEliminar
  4. Caro Rúben,

    Li com atenção o seu comentário, bem como já tinha visto o vídeo que referiu, e penso que estamos a falar de coisas ligeiramente diferentes mas que podem ser confundidas.
    A minha análise de taxa de ocupação é baseada em dados oficiais sobre os voos entre uma determinada origem e um certo destino. Tomemos por exemplo os voos diretos entre Lisboa e o Faial (LIS/HOR/LIS) — o que a taxa de ocupação reflete são os lugares ocupados dentro do avião face à capacidade máxima. Concordo consigo que esta taxa de ocupação é agnóstica em relação a que passageiros vão dentro do avião (ex., podem ser do Faial, do Corvo, das Flores, do Pico, etc.) mas todos contam para a taxa de ocupação LIS/HOR/LIS, salientando (tal como está patente no artigo) que foi aquela que teve a maior taxa de ocupação média anual de todas as analisadas.
    Outra coisa, que talvez é o que se refere e que é mencionado no vídeo, é quando um passageiro com origem do Faial pretende chegar a Lisboa — se ele viajar nos voos diretos LIS/HOR/LIS, então conta para a taxa de ocupação desta rota; caso viaje via Pico ou via Terceira ou via São Miguel ou via Santa Maria, então contará noutra taxa de ocupação.
    Por outras palavras, a taxa de ocupação de uma rota não corresponde às pessoas de uma determinada origem que pretende chegar a um certo destino, mas sim a quantidade de pessoas que estavam dentro de um avião que faz voos diretos entre dois pontos.
    Para se descobrir quantas pessoas efectivamente viajam entre origem e destino verdadeiros, a única forma será via inquérito, pois dada a quantidade de companhias aéreas diferente que servem a região, podem ocorrer situações como a seguinte: um passageiro do Faial apanhar o barco para o Pico, viajar para São Miguel de avião, depois apanhar uma low cost para Lisboa e finalmente comboio para o Porto; em termos estatísticos, a taxa de ocupação que ele conta é no voo PIX/PDL (Pico/Ponta Delgada) mas efetivamente o que ele quer fazer é Faial-Porto. Hipoteticamente, se houver muitas pessoas a fazer este percurso, eventualmente justificar-se-ia um voo direto Faial-Porto, mas sem inquéritos nunca se saberia disso.

    Por fim, uma pequena nota: eu apenas comento e analiso números e não pessoas, tentando aplicar a minha experiência profissional de análise estatística a questões relacionadas com a minha terra natal. Dito isto, a sua referência final "explique-me lá estas situações que eu e o restante pessoal "ignorante" gostaria de saber :o" não me pareceu adequada — nunca insinuei que detenho a verdade nem que quem quer que seja é ignorante, pois eu não sou melhor que ninguém; sou uma pessoa igual às outras, isto é, tenho falhas mas tento sempre fazer o melhor que sei, bem como todos os dias aprendo imensas coisas novas com as pessoas com quem interajo, sendo que entendo ser essas uma das maravilhas de se viver em sociedade!

    Haja saúde!

    ResponderEliminar
  5. Excelente trabalho Ivo ! Uma grande ajuda na leitura dos dados recentemente divulgados pela Azores Airlines aos deputados da ALRA. Efetivamente no que toca ao Aeroporto do Pico, o aumento de voos (quer em número, quer na eliminação da escala na Terceira) tem sido efetivamente acompanhado por um aumento da taxa de ocupação. O Pico está de parabéns e penso que o crescimento não ficará por aqui !

    ResponderEliminar
  6. http://tribunadasilhas.pt/index.php/opiniao/item/13273-doa-a-quem-doer

    ResponderEliminar
  7. Excelente análise, em que ambos os artigos (o deste blog e o mencionado via este link) se complementam e se alicerçam em conclusões comuns. Aliás, o autor refere o seguinte:
    "Se compararmos 2015 com 2016, torna-se claro o aumento da procura pelas rotas do Faial e do Pico. Ambas as rotas tiveram aumento de voos disponibilizados e passageiros transportados. No entanto, o impacto foi superior no Pico, que partia de um valor muito inferior, e que já há muito tempo merecia um reforço de ligações."
    Não poderia estar mais de acordo e o reforço de ligações merecido para a ilha montanha mencionado pelo autor vai de encontro ao que eu referi no post deste blog: o Pico está na moda!

    Haja saúde!

    ResponderEliminar

Para evitar perder a ideia do comentário, sugere-se que escreva primeiro o mesmo num editor de texto e depois copie para aqui; assim, se ocorrer algum erro (por vezes não funciona à primeira), tem sempre cópia do seu texto.

Muito obrigado por comentar neste blog! Haja saúde!