sexta-feira, 22 de junho de 2018

A migração dos baleeiros do Cais do Pico na década de 1950


Até cerca de 70 anos atrás, uma migração interilhas ocorria anualmente, mais concretamente entre o Pico e o Faial: durante a "Campanha de Verão", os baleeiros das Armações Baleeiras Reunidas, do Cais do Pico, baleavam na parte oeste da ilha do Faial por falta de baleias no Canal Pico / São Jorge, de parceria com as Armações do Faial que também para ali se deslocavam.

Esta caça à baleia baseada no Capelo levava a que não só baleeiros, mas também as respetivas famílias, se estabelecessem temporariamente no Faial, alojando-se em casas construídas em pedra cobertas de palha de trigo, a que chamavam palhotas.

Na madrugada do dia 27 de setembro de 1957, com a erupção do Vulcão dos Capelinhos, desapareceu aquela que foi conhecida como "a maior Estação Baleeira do Arquipélago dos Açores"; grande parte dos baleeiros e suas famílias "abandonaram imediatamente aquela estação, seguindo uns diretamente para o Cais do Pico", tal como relatou um jornal da época.

Felizmente, e graças aos registos escritos, fotográficos e em vídeo [alguns em anexo], esta epopeia da migração dos baleeiros do Cais do Pico na década de 1950 pode ser, de certa forma, revivida.

Haja saúde!









A estação baleeira dos Capelinhos na ilha do Faial
(por Francisco Medeiros in À sombra do Vulcão)

O Porto Baleeiro do Comprido, na parte Oeste da Ilha do Faial foi a maior estação baleeira e a mais produtiva na caça à baleia do Arquipélago dos Açores.

Até ao ano 1957, durante a Campanha de Verão, os baleeiros alojavam-se em casas construídas em pedra cobertas de palha de trigo a que chamavam palhotas. Na rampa do porto varavam cerca de 20 botes baleeiros, pequenas embarcações de pesca e na sua pequena baia ancoravam 7 lanchas baleeiras a motor.

Parte destas embarcações, pertenciam às Armações baleeiras Reunidas, do Cais do Pico, Ilha do Pico, que por falta de baleias no Canal Pico / São Jorge, baleavam de parceria com as Armações do Faial que também para ali se deslocavam.

Para se fazer uma ideia em 1945 os botes daquela estação caçaram 67 baleias, que produziram 180 toneladas de óleo, vendidos a 4$00 o quilo.

Por aquela estação baleeira, passaram os mais afamados oficiais, trancadores e mestres baleeiros do Pico e do Faial.

Para mencionar alguns, recordo-me de José Brum, mais conhecido por José Batata que baleou no Capelo 22 anos, o irmão deste, Francisco Brum de Simas, o Pé Leve, nascidos na Ribeira do Meio; os filhos deste, o João Pé Leve que foi mestre da lancha 'Garota' e o Alberto Pé Leve.

Do Cais do Pico, o António Joaquim Madruga pai e filho, os irmãos António e Manuel Fula, este com 6 filhos todos baleeiros, dos quais o José Fula, também oficial, fez a proeza de caçar 4 baleias num só dia, o Manuel Fula que foi mestre de lancha baleeira; os mestres José Caneca e os filhos João que foi maquinista e o José também oficial baleeiro; o Manuel Peixe Rei; os Januários, oficiais e trancadores, estes também proprietários de armação baleeira; os Cristianos, mestres e maquinistas; os Aldeias, com destaque para o Tomé Carapinha que foi trancador, oficial e mestre de lancha; os Bispos, o João que foi mestre de lancha, o Edmundo maquinista, o António que foi o último trancador do Cais do Pico, e o José remador.

Do Faial, os Serpas da freguesia das Angústias, João Serpa, pai e os filhos Mário e Jaime Serpa, este também com descendência de baleeiros tinham o alcunha de Cabritos, de onde saíram um mestre de lancha e trancadores; o Mestre Manuel Santa Barbara, oficial baleeiro de que foi seu trancador um dos grandes baleeiros do Faial, o José de Jesus conhecido pelo José Rofino, que terá sido o último oficial a exercer a actividade baleeira na Ilha do Faial.

Por ali passaram muitos outros do Pico e Faial que não conheci: Mestre João Lelé, Mestre João Maurício e outros das Lajes e das Ribeiras do Pico.

Muitos outros baleeiros do Cais do Pico se deslocavam para o Capelo, acompanhados da família: lavavam as suas embarcações de pesca, para ali pescarem e, quando tempo não estava de feição, pescavam na costa, vendiam o peixe na freguesia do Capelo ou salgavam-no para trocar por milho. Outros ajudavam os agricultores daquela freguesia, muitos deles também baleeiros. As carências eram tantas que estavam sempre preparados para a sua sobrevivência.

Como disse o Poeta tinham sempre "um pé em Terra, outro no Mar". Quando regressavam no fim da campanha, já traziam o milho, para sustento da família.

Recordo-me de um oficial Baleeiro, o Luisinho, de pequena estatura natural e residente no Capelo. Vinha à cidade com frequência. Certo dia, na taberna do João de São Mateus, junto ao Canto da Doca, ali junto à Igreja das Angústias no Faial, o José Cardoso, oficial baleeiro, homem forte, que também estacionou no Porto do Comprido, convidou o Luisinho para tomar um copo; ao chegar perto do balcão, agarrou-o pela roupa com uma só mão e sentou-o em cima do balcão.

Nas vigias de baleia do Costado da Nau, sobranceiras ao Farol dos Capelinhos que apoiavam os baleeiros do Porto do comprido, passaram muitos vigias de grande fama. O Izaias, o Rosairinha, os Caldeiras, o António Jezinho, o João Lúcio e muitos outros.

Na madrugada do dia 27 de Setembro de 1957, com a terra balançando continuamente, os vigias de baleia do Costado da Nau, a escassos metros acima do Farol, notaram o oceano revolto a meia milha da costa, para os lados de oeste. Desceram do Costado da Nau pela última vez, alertaram os faroleiros e os baleeiros estacionados no Porto do Comprido ali próximo. Tinha-se extinguido a maior Estação Baleeira do Arquipélago dos Açores.

O mar entrava em ebulição e havia cheiros fétidos. O Vulcão dos Capelinhos tinha entrado em actividade.



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